Carlo Celso Lencioni Zanetti
Academia Caçapavense de Letras
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“A cela do
castigo é estreita, fria e não há nenhuma manta para o detento se cobrir. Pelo
buraco que serve de latrina, de vez em quando, sai uma ratazana que olha com
curiosidade o homem encolhido no canto. Fora, ouvem-se gritos e o barulho
habitual da prisão de Aguadores, uma das mais temidas de Cuba.”
 
 
“ (Wilman)
Vilar (Mendoza), que morreu após uma greve de fome, ganhava a vida fazendo
trabalhos de carpintaria e alvenaria. Sua especialidade eram as belas flores de
grande caule, em madeira, que os turistas compram para levar como lembrança da
ilha. Um caule com seis pétalas, talhado com a paciência de quem sabe que o
tempo, em Cuba, não vale muito e os minutos não o tornaram nem mais próspero
nem mais feliz.”
 
 
“Em Cuba,
como diz um amigo, “ninguém sabe o passado que o aguarda”.”
 
 
”A
necessidade de usar o corpo como praça pública da indignação, em uma ilha onde
protestar é proibido, foi determinante para o triste desenlace do dia 19 de
janeiro” (de 2012).
 
 
Trechos de artigo de YOANI SANCHEZ.
 
 
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Vilar
tinha 31 anos...e sonhos de liberdade...
 
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A cela do castigo é estreita
 
e não há nada que possa proteger
o corpo
 
do frio intenso que o congela à
morte,
 
se não morrer antes pela ação dos
seus algozes
 
ou pela fraqueza que lhe toma
conta,
 
maior que a força da alma que o
conforta.
 
A cela do castigo é estreita
 
como as mentes dos que a
conceberam,
 
embora capazes de inimagináveis
crueldades
 
em nome da ideologia que resiste
sucumbir...
 
Na solitária cela de onde os
olhos se afastam
 
só lhe dá companhia a ratazana
imunda
 
mas menos profana do que aqueles
 
que juntaram seus destinos
insólitos.
 
O ser que se encolhe ao canto,
 
não sente mais a dor intensa que
o domina,
 
recolheu ao fundo de si mesmo o
pranto
 
que gostaria de derramar, não por
si,
 
mas pelos que gritam em Aguadores
 
os sons que se eternizam na longa
noite 
 
que sufoca a ilha de seus muitos
amores.
 
Pensa também naqueles que não
podem gritar
 
por lhes faltar a coragem do
gesto
 
ou por temerem pelos seus, 
 
ameaçados pelo anonimato dos
bajuladores
 
sob o jugo da ditadura cruel,
 
de tantos apoiadores cegos de
alma 
 
mas de olhos vivos a admirarem
 
Sua culpa, pensar. Seu mal, se
expressar.
 
O passado que não teve lhe foi
dado por seus algozes;
 
condenado pelas palavras,
fizeram-no maldito.
 
A bandeira em que se enrolou um
dia 
 
sequer lhe servirá de mortalha,
pois,
 
os tiranos temem os símbolos de
afeto
 
por unirem os tiranizados.
 
O passado que lhe foi criado o
tornou mais um
 
a sucumbir sob as imposições do
pensamento único,
 
para regozijo e repugnante apoio
dos amigos brasileiros,
 
velhos – uns nem tanto -
camaradas, todos companheiros,
 
convidados ao eterno velório da
democracia cubana.
 
Seu corpo, “praça pública da
indignação”, 
 
foi o local que lhe restou para o
protesto 
 
que não lhe podem tirar ou impedir;
 
seu corpo é o palco da sua
imolação.
 
As flores de madeira enfeitarão,
agora, o seu caixão.
 
Flores sem perfume, mas contendo
nelas
 
o cheiro da morte injusta, 
 
levado por elas além da ilha.
 
São elas, de uma só cor e sem
olor,
 
mais belas do que a estrela de
flores vermelhas
 
que enfeita a casa presidencial
brasileira.
 
Vermelhas como o sangue que corre
em Cuba!
 
Na cela escura, fétida e fria,
 
a ratazana espera uma nova
companhia...